domingo

Ah «persona», como não te usar e ser!

"Vestiu um vestido mais ou menos novo, pronta que queria estar para encontrar algum homem, mas a coragem não vinha. Então, sem entender o que fazia  — só o entendeu depois  — pintou de mais os olhos e de mais a boca até que o seu rosto branco de pó parecia uma máscara: ela estava pondo sobre si mesma alguém outro: esse alguém era fantasticamente desinibido, era vaidoso, tinha orgulho de si mesmo. Esse alguém era exactamente o que ela não era.
    Na hora de sair de casa, fraquejou: não estaria exigindo de mais de si mesma? Não seria uma bravata ir sozinha? Toda pronta, com uma máscara de pintura no rosto - ah «persona», como não te usar e ser!  — sem coragem, sentou-se na poltrona de sua sala tão conhecida e seu coração pedia para ela não ir. Parecia prever que ia se machucar muito e ela não era masoquista. Enfim apagou o cigarro-da-coragem, levantou-se e foi.
    Pareceu-lhe que as torturas de uma pessoa tímida jamais tinham sido completamente descritas  — no taxi que rolava ela morria um pouco."




2 comentários:

Mónica disse...

o cigarro-auto-conforto
n gosto de pessoas timidas, têm este quê de falta coragem vs atrevimento

Anónimo disse...

Ah a Clarice, a Lispector, a X e a Y. Porque será que me parece sempre a mesma pessoa em todo os textos